terça-feira, 19 de julho de 2022

Boçalidade versus Poder

Em tempos antigos sempre se afirmou, que conhecimento é poder, e que o
conhecimento alarga a consciência. Creio que isso ainda não mudou como teoria, todavia o dia a dia nos prova o contrário, hoje conhecimento é um artigo de luxo, vivemos cercados de aventureiros do saber, que emitem seus pareceres desvairados sem nenhum pudor.
Estamos vivendo a era dos cientistas de rodapés, não de um livro, mas de uma rede social qualquer. Longe de mim de criticar as redes sociais, as quais considero um milagre humano. As redes com suas mais sofisticadas ferramentas não têm culpa, se desavisados culturais as utilizam para disseminarem boçalidades, empoderando-se assim com a ignorância de seus pares.
Onde a tecnologia chegou com inteligência, presenciamos verdadeiros prodígios, caso bem concreto são as startups, comandadas por cérebros juvenis brilhantes, que alcançam o mundo com as suas ousadias tecnológicas assustadoramente benéficas. E, certamente esse sucesso não se deve às famigeradas leituras de rodapés, e sim, às suas horas e horas de leituras maçantes, estressantes de manuais que inspiram, provocam, desafiam e lançam seus leitores para uma mundo até pouco tempo ininteligível e inimaginável.
Paralelo a isso, temos uma massa gigantesca de outros humanos, que se contentam em lerem citações, notas de rodapés, comentários “fakes” ou não, de algumas redes sociais, e saem por aí vociferando palavras de ordem, como se o seu saber fosse a melhor teoria, que o mundo já viu.
A não leitura, o pouco empenho para conhecer e aprofundar, geram boçais, que decoram alguns textos, três quatro jargões, se empanturram de gírias, normalmente de baixo calão, e se autoproclamam profetas do saber, fazendo dos seus discursos uma rajada de impropérios, recheadas de ódio contra os diferentes. Quem não tem saber, tem estultices, que viralizam em terrenos vazios, a mente e o coração de quem não se cultiva, não investe em si. Quem vive do discurso, da palavra, mas não é culto, agrada no início, mas depois se torna cansativo, porque se transforma em um falar repetitivo, e no afã de querer agradar quem lhe escuta, recheia suas falas com as piadas mais insossas e desconexas, como também é desconexo o seu pensamento.
Estamos vivendo um momento impar da Humanidade, temos recursos, que jamais outras eras tiveram, mas grande parte dos homens e mulheres que ocupam espaço de poder, não se empoderam do saber, satisfazem-se com banalidades e vulgaridades, beirando a um surto de idiotia mesclada com delírios psicóticos.
Em todas as áreas do saber, se exige o mínimo de coerência de contextos, onde a realidade seja de verdade, mesmo quando seu conteúdo é essencialmente abstrato. Não é a materialidade do argumento, que lhe dá sustentação e solidez, mas é a sua lucidez e o seu direcionamento, que reforçam o quanto ele é real, e aqui entramos no campo do discurso filosófico, teológico e antropológico, que é normalmente o teor de nossas falas.
Enquanto o saber como consciência não for a base do falar e agir de todos nós, seremos obrigados a ferirmos nossos ouvidos com os absurdos surreais de um poder que não pode. Certos discursos, mesmo nas Igrejas, as pessoas só os escutam, por um principio de fé, ou por medo de se perderem, se é que um dia já se tinham encontrado. Não saber do inferno e melhor que saber de um céu, que é anunciado por alguns néscios pregadores como o lugar dos puros e imaculados, que lavaram seus cérebros na terrível água de uma santidade sem espiritualidade.
Por isso, enquanto houver conhecimento e saberes, os boçais até poderão dar o tom das coisas por algum tempo, mas não durarão, porque não se sustentam na rigidez da eternidade da existência. Existir exige conhecer. Quem não tem saber não sobrevive.
É só uma questão de tempo até os boçais e seus sequazes tropeçarem no próprio surto e começarem uma luta de autodestruição. E aí como sempre o novo se fará ouvir e sentir.